Rodrigo,
Partilhei contigo inúmeros momentos, incontáveis sentimentos, imensas alegrias, algumas tristezas.
A minha maior mágoa terá talvez sido quando regressámos a Portugal e fui viver com a Mãe, separando a nossa união perpétua, como um pacto de sangue que secretamente fizéramos. Passei a ver-te ao longe, embora estivesses sempre por perto. Foi doloroso e árduo, imaginar-te só, saber-te baralhado, confundido, atrapalhado, num mundo novo por descobrir. Ver-te a chorar na Praça de Algés onde fomos parar não sei bem porquê. Sei que tentei dar-te algum apoio, nesse e noutros momentos, talvez tenha pecado por escasso. Se assim foi peço o teu perdão.
Quando os nossos Pais se separaram recordo-me de ter decidido ficar com o Pai, na Suiça, não porque era o Pai ou a Mãe, para ser sincero e porque talvez na altura não percebia o que se passava, que estava a decidir uma vida e não um simples momento, mas sobretudo para estar junto de ti, continuarmos as nossas brincadeiras, aprofundar as nossas afinidades, para não nos separarmos.
Não me arrependo dessa decisão.
E foi assim que partilhámos muitos anos da nossa vida, muitos anos da minha vida, pois a tua existia ainda antes de eu pisar este mundo. Fizemos o caminho com felicidade, como deveria sempre ser, como um percurso dourado, brilhante e quente.
A única vez que nos chateámos a sério foi em Paris. Estávamos sozinhos em casa e começámos a discutir nem sei bem porquê, um assunto menor certamente, e de repente voaram estaladas. Passado algumas horas fui ao teu quarto pedir-te desculpas, não por achar que tinhas razão, mas para não ficarmos assim zangados, virados um contra o outro. Não as aceitaste.
Infelizmente o tempo e a idade tomaram conta de nós, das nossas vidas, das nossas amizades díspares, das nossas saídas em separado, dos cursos superiores distintos.
Tenho poucas certezas nesta vida, ando à procura de muitas respostas para muitas questões, como certamente tu andarás, mas tenho duas que ficarão comigo para sempre. A primeira é de que me sinto outro desde que nos separámos, diferente, algo em mim não está certo, parte de mim sente uma angûstia permanente que tem afectado a minha vida desde esse momento. A Catarina tem sentido na pele essa minha tristeza intríseca que dura e dura e dura. Não pedi pilhas Duracell para o meu coração. A segunda é um pouco o oposto, a felicidade extrema de seres meu irmão, de teres partilhado tudo comigo, de continuares a fazê-lo apesar da escassa comunicação vinda de mim, o orgulho que tenho em ti, no homem que te tornaste, na pessoa que és.
Tornei-me mestre em escrever textos lamechas à tua conta.
Espero que tenhas algum orgulho em mim também, nem que seja por ser teu irmão. Nem que seja por saberes que poderás sempre contar comigo, a qualquer minuto da tua vida, a qualquer passo que dês e para o qual precises da minha ajuda. Fazes parte de mim.
Rodrigo, o meu mundo sem ti não seria o mesmo, seria um espaço com menos luz, menos brilho. Apesar de não nos vermos muito, culpa minha certamente, eu sei que existes, que estás por cá, e isso reconforta-me o coração. Admiro a pureza que continuas a manter. Nunca a percas pois faz de ti o homem único e maravilhoso que és.
Amo-te bro.
Parabéns!