25 novembro 2010

Greve fecal.

Sim, o título diz tudo, esta foi uma greve de merda.

Foi a greve dos centros comerciais, dos passeios à beira mar, do acordar tarde, do descanso puro e duro, uma greve que nada reivindicou e a que nada serviu. Uma greve de propósito sem propósito.


Em vez de aproveitar a única e histórica ocasião que se apresentava para fazer uma manifestação de proporções nunca vistas em Portugal, os sindicatos, talvez com receio do frio e da chuva, preferiram o recato dos lares de cada trabalhador. Não duvido que, em casa, sentados no sofá, por baixo da mantinha e contentes porque "querida, hoje podemos ficar juntos porque não trabalho", cada português tenha veemente e sonoramente reivindicado os seus direitos, mas sejamos sinceros, não é bem a mesma coisa. Uma sonora voz silenciosa.

À distância de um dia estou ainda a vê-los, agarrados às suas bandeiras da UGT ou da CGTP, com os lindos e coloridos coletes vermelhos, sentados na poltrona. Mas estou a ser demasiado crítico, é verdade, alguns saíram de casa, tomaram essa iniciativa, tiveram essa força, coragem e determinação e foram ao centro comercial mais próximo despachar as compras de Natal, que isto de ter um dia livre no meio da semana não é todos os dias.

Nos telejornais da noite foi sem espanto que vi o ar, espantado, de muitos jornalistas estrangeiros a dizer que nunca tinham visto, numa greve, tão pouca gente na rua, tanta passividade. Vieram para filmar desacatos, cargas policiais, manifestantes em fúria, sindicalistas a chorarem, habituados a espanhóis, italianos, gregos, franceses ou inglêses, e foram para casa com imagens de um qualquer Domingo de inverno, pacato, frio e deserto de almas.

Pessoalmente até agradeço porque tive que trabalhar e o trânsito nunca esteve melhor, nem no pico do mês de Agosto, entristece-me é perceber que foi uma fantástica oportunidade que os trabalhadores e seus representantes deixaram escapar para verdadeiramente marcar a história. Estas greves gerais caseiras até podem funcionar, mas somente se se prolongarem mais do que 24 horas, mais do que 48, talvez 3 ou 4 dias. Assim, um só dia, umas míseras 8 horas de trabalho efectivo que se perdeu, é que não, "não dá né"!

Por isso a greve foi fecal sim, no sentido em que não beliscou o governo, não beliscou Sócrates, limitou-se a ser aquele cheiro que persiste em não sair da casa de banho, umas simples cócegas, uma dor nas costas que depressa passa, aquele macaco do nariz que teima em não sair, só isso, simplesmente isso, nada mais. Foi como aquelas crianças birrentas que querem o doce antes de acabar a refeição, batem o pé a choramingar, depois levam uma palmadinha e "come e cala".

Costumo dizer que a anarquia funciona melhor quando está organizada. Visivelmente, a apatia também.